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Sigilo profissional: médico pode denunciar aborto?

Atualizado: 28 de mar. de 2023

O sigilo profissional dos médicos é elemento fundamental para o exercício regular da profissão. Sem ele, a relação de confiança entre o profissional e seu paciente é severamente limitada, impedindo o correto diagnóstico e o tratamento adequado.



Em recente decisão, o poder judiciário brasileiro mostrou que entende bem a importância do sigilo profissional - e não tolera, em qualquer hipótese, a sua violação indevida. A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, no Habeas Corpus nº 783.927/MG, julgado no dia 14 de março de 2023, decidiu que uma ação penal instaurada pelo crime de autoaborto (art. 124, Código Penal) não poderia prosseguir em desfavor da acusada, em razão de ter sido fundada em provas ilícitas, em virtude da quebra do sigilo médico.


De acordo com o relatório do caso, uma paciente, em Conselheiro Lafaiete/MG, procurou atendimento hospitalar após sequelas sofridas em razão da ingestão de medicação abortiva. O profissional médico que a atendeu comunicou o fato à autoridade policial, e posteriormente foi testemunha da acusação no processo criminal contra a acusada.


O comportamento do médico, entretanto, violou diversos preceitos éticos, a começar pelo artigo 73, parágrafo único, do Código de Ética Médica (CEM) vigente à época, e mantido pelo atual, nos mesmos termos, que proíbe o compartilhamento do prontuário médico com as autoridades em âmbito criminal:


CAPÍTULO IX - SIGILO PROFISSIONAL

É vedado ao médico:

Art. 73. Revelar fato de que tenha conhecimento em virtude do exercício de sua profissão, salvo por motivo justo, dever legal ou consentimento, por escrito, do paciente.


Parágrafo único. Permanece essa proibição: a) mesmo que o fato seja de conhecimento público ou o paciente tenha falecido; b) quando de seu depoimento como testemunha (nessa hipótese, o médico comparecerá perante a autoridade e declarará seu impedimento); c) na investigação de suspeita de crime, o médico estará impedido de revelar segredo que possa expor o paciente a processo penal.



Além de infração ética, o Código Penal criminaliza a prática de divulgação, sem justa causa, de segredo profissional (art. 154, CP), por parte de quem teve ciência do fato em virtude da profissão, e cuja revelação possa causar dano a outrem. É, portanto, vedado ao médico procurar a autoridade pública para comunicar fato criminoso, que só veio a tomar conhecimento em razão da confidencialidade feita por seu paciente.


De forma semelhante, assim como o CEM, o Código de Processo Penal (CPP) proíbe expressamente de prestar depoimento como testemunha pessoas que, por dever profissional, devam manter sigilo - a menos que a parte acusada, por interesse próprio, as peça expressamente para abrir mão do sigilo profissional (art. 207, CPP). Este profissional, portanto, jamais poderia ter deposto a favor da acusação.


Ao final, o Superior Tribunal de Justiça não só impediu a continuidade do processo criminal contra a paciente, como determinou a remessa do caso ao Conselho Regional de Medicina do Estado de Minas Gerais, para a apuração da responsabilidade profissional do médico delator - que pode, ainda, vir a sofrer responsabilização criminal e civil (indenizar a paciente).


Quer saber mais? Fique atento, pois iremos falar sobre as situações em que os médicos podem quebrar o sigilo.


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